domingo, 17 de julho de 2011

A ESTREIA APÓS 10 ANOS DE ESPERA

 Em 1985, a Rede Globo exibia a novela que dez anos antes havia sido proibida pela censura. Leia matéria publicada na época.

Agora é para valer: amanhã, às 20h, estreia Roque Santeiro. Não há qualquer ameaça de que se possa repetir a história de 10 anos atrás. A Globo anunciou a novela, chegou a gravar 31 capítulos e foi impedida de exibi-la. Jamais houve uma explicação razoável para o veto. Boatos diziam que o mau humor da Censura fora despertado pelas suspeitas de que o autor, Dias Gomes, estivesse usando Roque Santeiro como um disfarce, driblando os censores que, em 1965, proibiram sua peça O Berço do Herói. Contava a história de um herói militar que, despido da aura de mito, reduzia-se a um desertor. O personagem central de Roque Santeiro também era um mito, fazedor de milagres. Herói, mas sem patentes no peito.

Cartas foram trocadas entre Rio e Brasília, explicando que a semelhança era apenas formal. Respostas não chegaram à Globo. Uma semana antes da estréia, a Censura resolveu manifestar-se: a novela era imprópria para as 20h. E para as 22h? Desencorajadora, a resposta. Poderia ser exibida, com cortes. Tantos, que da história criada por Dias Gomes restavam alguns minutos. A Globo, num comportamento surpreendente, desafiou as ordens oficiais e continuou com as chamadas de Roque Santeiro no ar. No dia da estréia, ao terminar o Jornal Nacional, Cid Moreira leu um editorial duríssimo de Roberto Marinho, opondo-se à Censura. Terminada a edição, um frisson: a abertura da novela foi exibida, como se Roque Santeiro fosse estrear. Mas Cid Moreira voltou à tela e releu o editorial, abrindo espaço para a reprise de outra história de Dias Gomes, Saramandaia.

Passados 10 anos, Roque Santeiro deixou de ser "uma ofensa à moral pública e ameaça à segurança nacional". Na verdade, Dias Gomes nunca viu temperos tão fortes em sua história. "A novela foi apenas um bode expiatório em dado momento e sua proibição teve objetivos políticos insondáveis" — diz ele. Os rótulos aplicados pela Censura à novela até o preocupam: "O público não deve esperar uma obra terrível, sequer chega a ser moralmente audaciosa. A novela não tem nada de mais. A Censura era inteligente de menos."

Como em todos os textos de Dias Gomes, a crítica social é um dos temas de Roque Santeiro. Cutuca a sociedade capitalista e a dupla face do progresso . Fala da corrupção, do desenvolvimento que beneficia apenas um pequeno grupo. "Uma meia paródia do milagre brasileiro" — brinca. Mas o centro da história é a discussão do mito.

Roque Santeiro (José Wilker) fazia santos. Tornou-se herói no dia em que Asa Branca foi invadida por bandidos e todos fugiram, menos ele. Ficou na igreja, defendendo o ostensório, e morreu por sua bravura, o corpo jogado no rio e jamais encontrado. Tempos depois sua imagem apareceu a uma menina doente, curando-a dos males. Virou mito, um santo e proporciona um rendoso negócio para muitos habitantes de Asa Branca, especialmente para o esperto Zé das Medalhas (Armando Bogus). Outra figura importante na trama é a Viúva Porcina (Regina Duarte), ex-mulher de Roque. Amiga do dinheiro, liga-se a Sinhozinho Malta (Lima Duarte) na exploração do mito. Ele é o chefe político da região e tem projetos ambiciosos: casar com Porcina para aumentar sua influência e construir o aeroporto da cidade, com o olho nos ganhos ilegais que essa obra lhe pode dar.

Outros habitantes importantes da cidade são o Padre Hipólito (Paulo Gracindo), que não tolera o chamado progresso, principalmente quando ele traz uma boate para a cidade. Matilde (Yoná Magalhães) e suas meninas fazem tremer boa parte de Asa Branca. Mas o maior pavor da cidade é o professor Astromar Junqueira (Ruy Rezende) que, dizem, vira lobisomem depois da meia-noite. Pelo jornal, dedica sonetos apaixonados a Mocinha (Lucinha Lins), ex-noiva de Roque.

O mito de Roque Santeiro toma grandes proporções, até um filme sobre sua vida será rodado. Para interpretar o herói, um jovem ator, Roberto Mathias (Fábio Júnior), apaixonado por todas as mulheres, de Porcina a Tânia (Lídia Brondi), filha de Sinhozinho Malta.

Uma história bem brasileira, foi assim que Dias Gomes imaginou Roque Santeiro. Nas reuniões de elenco e com o diretor Paulo Ubiratan, pediu que fossem esquecidas as fórmulas trazidas pelo cinema e que criassem personagens reais. O realismo mágico é o tom da novela. As mesmas instruções Dias Gomes passou a Aguinaldo Silva. É ele o encarregado de continuar a história, parada no 51° capítulo em 1975. Aguinaldo Silva acha que só existe uma maneira de escrever essa história: ser o "cavalo" de Dias Gomes. Ele tem o universo ficcional muito próprio e esse trabalho vai servir como meu mestrado de novelista."

Um comentário:

  1. estou vendo que vc e dedicado ao site msm 5:00 da manhã e por isso que adoro seu trabalho Parabéns Jean Cândido pelo seu trabalho esplendido!!!
    Pedro Henrique!!

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